“Quero falar-te dos meus sentimentos”. Foi assim que a comunicação começou.
Comunicar
é como jogar andebol. Eu atiro a bola e tu apanha-la. Depois, tu atiras
a bola e eu apanho-a . E, outra vez, eu atiro a bola...
“Quero falar-te dos meus sentimentos.” Foi assim que a comunicação começou.
Tal
como precisamos de atirar a bola para trás e para a frente para jogar
andebol, precisamos de falar uns aos outros dos nossos sentimentos para
comunicar.
Se estamos demasiado perto ou excessivamente afastados
uns dos outros, não é fácil jogar andebol. A comunicar é o mesmo. Se
estivermos muito perto ou demasiado afastados dos nossos amantes ou dos
nossos amigos ou de um filho ou dos nossos pais, não será fácil
comunicar com eles. A comunicação não começa com ambas as pessoas a
falar ao mesmo tempo. O primeiro gesto tem de partir de uma delas.
Alguém tem de atirar a primeira bola. Mas você pode não querer ser o
primeiro a atirar a bola – pode querer esperar que alguém lha atire.
(Porque quando a atira e ninguém tenta apanhá-la, fica infeliz.)
Há
alturas em que se sente inesperadamente rejeitado. Há alturas em que
atira a bola, querendo jogar andebol com outra pessoa, e acaba por ver
essa pessoa atirar a bola a uma terceira. Habituamo-nos desde cedo a que
algumas pessoas não ouçam o que lhe queremos dizer. “Agora estou
ocupado”, dizem elas. “Falaremos mais tarde, está bem?” E assim,
acabamos por pensar “Afinal o que eu digo não interessa”. É por isso que
é preciso ter a coragem para ser o primeiro a atirar a bola. Algumas
vezes, quando finalmente arranjamos coragem para atirar a bola a outra
pessoa, ela desvia-a para o lado. Alguma vez isto lhe aconteceu? Ou
lançamos uma bola com toda a nossa alma, e a pessoa a quem atiramos
devolve-a com um pontapé... Alguma vez isso lhe aconteceu? Ou atiramos
uma bola muito rica e muito grande, que nos é devolvida muito mais
magrinha... Alguma vez isso lhe aconteceu?
Já alguma vez disse a
si próprio, “Em vez de atirar a bola eu mesmo, e ser infeliz, é melhor
não a atirar nunca e esperar que alguém ma atire”? Mas e se ninguém a
atira...?
Você não é o único a ser inesperadamente rejeitado, a
receber a bola de volta, intocada, a ser infeliz. Talvez dê também
pontapés nas bolas algumas vezes, e faça alguém infeliz, sem saber que o
está a fazer! Todos nós queremos que as bolas que atiramos sejam
aceites. Todos nós queremos ter alguém que ouça o que temos para dizer.
Todos nós queremos que os outros saibam que existimos. Mas quem é que
realmente está pronto para aceitar todos aqueles que querem que os
outros dêem por eles? Se a pessoa a quem atiramos uma bola com toda a
nossa alma a apanhar, e se nós apanharmos a bola que essa pessoa nos
lança de volta, então um acto de comunicação acontece. Mas às vezes
sentimos, “Ele não a apanha do modo como eu queria que o fizesse!” Ou,
“Não há maneira de eu poder apanhar a bola que ele me atirou!”
Há
sempre infelizmente muitas tentativas de comunicação que não chegam a
concretizar-se. Quando as comunicações não concretizadas se acumulam, as
nossas emoções tornam-se instáveis. Tornamo-nos tristes , preocupados,
zangados, preconceituosos, pouco amigáveis. E, de vez em quando,
explodimos... Então, pouco a pouco, chegamos a um ponto em que não
sentimos nada... E mais tarde ou mais cedo, estamos sós.
Se a pessoa a
quem atirámos a bola não a apanhou como queríamos não a culpemos por
isso. Talvez seja simplesmente porque ela não é uma boa jogadora de
andebol. Talvez seja só porque estava nervosa e a mão lhe escorregou.
Talvez seja só porque a nossa bola era demasiado pesada.
Se o seu
patrão ou os seus pais ou o seu parceiro nunca o deixam dizer de sua
justiça, como é que isso o faz sentir-se? Se, pelo contrário, lhe atiram
três ou quatro bolas ao mesmo tempo, como é que isso o faz sentir-se?
A
sua capacidade de comunicar pode ser avaliada pela reacção da pessoa
com quem está a tentar comunicar. Mesmo que você não o queira admitir.
Há uma boa e uma má maneira de comunicar.
Trocar comunicação é uma
boa maneira de comunicar. Não trocar comunicação é uma má maneira de
Comunicar. É igualmente mau trocar alguma coisa que parece Comunicar –
mas que, na verdade, o não é.
O que significa parecer comunicar?
Falar somente sobre o tempo, ou sobre desportos, ou sobre o sexo oposto é
parecer comunicar. Falar somente do papel que desempenhamos na vida
(como alguém mais velho, como professor, como jovem, como marido, como
esposa) é parecer comunicar. Quando se trocam banalidades apenas
parecidas com comunicar não se corre o risco de aparentar solidão ou
sentir dor. Não temos de nos preocupar com sentimentos ou raciocínios
inesperados. Mas também não experimentamos a alegria súbita e
irresistível – ou o sentimento de estarmos realmente vivos.
Se o
comportamento da pessoa com quem se está a comunicar não muda, quer
dizer que não houve realmente qualquer comunicação entre vós. Houve
apenas jogos sociais. A verdadeira comunicação gera sempre um novo
comportamento. Há uma diferença entre comunicar com pessoas e
simplesmente confirmar relações existentes entre elas. As relações
tornam-se rígidas. Comunicar pode mudar isso.
Que tipo de relações
quer ter? Uma das dificuldades que há em comunicar é que sempre que
dizemos que queremos ser amigos de alguém estamos, na verdade, apostados
em mostrar a essa pessoa que somos um pouco melhores do que ele ou ela
é.
Que espécie de relacionamentos quer ter com outra pessoa? Um
relacionamento unilateral? Querem ignorar-se um ao outro? Jogar com
brutalidade? Ou esconder os vossos sentimentos? “Se ao menos eu fosse
melhor do que ele ou ela” diz você. Sem nos apercebermos disso, usamos
muitas vezes a comunicação como um meio de competir. Lembre-se porém: Só
se atinge um novo nível de comunicação com aquilo a que pode chamar-se
compreensão. As pessoas mudam o seu comportamento quando se sentem
compreendidas.
Gostar de outra pessoa não é necessariamente
compreende-la. Se há uma pessoa de quem simplesmente não goste,
esforce-se por conhecer primeiro o “eu” que não gosta dessa pessoa. A
forma como conhecemos outra pessoa coincide inteiramente com a forma
como nos conhecemos a nós próprios. Conhecer é saber ouvir o que a outra
pessoa está a dizer.
“Quero falar sobre os meus sentimentos”, pode
você dizer, “mas ninguém me ouve.” Não é o único que pensa isto muitas
vezes. De facto, isso é o que acontece sempre que as pessoas tentam usar
a comunicação para competir, em vez de conhecer. Enquanto pensar que a
capacidade para comunicar idêntica à capacidade para falar, nunca
experimentará um sentimento de união com outra pessoa. A capacidade para
comunicar depende da capacidade para fazer a outra pessoa falar – e da
sua capacidade para ouvir o que ela está a dizer. Só se ouve
verdadeiramente quando se ouve tudo o que a pessoa está a dizer sem
julgar, ou negar, ou comparar essa pessoa connosco.
Se se está
verdadeiramente a ouvir, e se está preparado para compreender, será
fácil para a outra pessoa falar. Mesmo que a bola seja difícil de
apanhar, ou tenha sido atirada debilmente,
se fizer o seu melhor para
a apanhar... consegue! Não conseguirá apanhar nenhuma bola se se
limitar a esperar. Se está pronto realmente para conhecer, dê um passo
em frente. Use o seu corpo todo. Estenda a sua mão e descubra o que está
mesmo à sua frente. Se pensa que compreender outra pessoa significa
concordar com tudo o que ela diz e faz, a compreensão não será fácil.
Conhecer
significa ouvir tudo o que a outra pessoa tem para dizer a tomar o que a
outra pessoa diz pelo seu valor facial. Se há compreensão, pode ter-se
pensamentos diferentes, interesses diferentes, sentimentos diferentes – e
ainda assim estar juntos. Quando o conhecimento ocorre, atinge-se um
outro patamar de comunicação. Quando um determinado patamar de
comunicação se cumpre, sentimo-nos um pouco aliviados. Quando duas
pessoas se encontram pela primeira vez, ambas estão nervosas. O problema
não é o nervosismo. O problema está em tentar escondê-lo.
Às
vezes, você preocupa-se tanto em atirar bem a bola que esquece a
preocupação e age como se nada estivesse errado. Ou preocupa-se tanto em
apanhar bem a bola que esquece a preocupação e age como se nada
estivesse errado. No próprio instante em que deixa de agir como se nada
estivesse errado, começa a conhecer-se a si mesmo. Somente depois de
você se conhecer a si mesmo pode ocorrer a verdadeira comunicação.
“Quero
falar-te dos meus sentimentos.” No momento em que começar a sentir
deste modo, começa a atirar bolas que são fáceis de apanhar. (É
impossível que alguém que não tenha jogado
muitas vezes andebol
apanhe bolas rápidas e em curva, mesmo que queira muito consegui-lo. Se a
pessoa com quem está a jogar não estiver pronta para o conhecer,
atire-lhe uma bola que seja fácil de apanhar.)
Vivemos graças à
comunicação. Quando a nossa comunicação com alguém se altera, a nossa
relação com os outros muda também. Tal como muda a nossa relação com o
trabalho e a nossa relação com a vida. Até a nossa relação connosco
mesmos mudará igualmente.
“Quero falar-te dos meus sentimentos.”
É assim que a comunicação começa.
Mamoru Itoh