"Tenho ganas de gritar dentro da cabeça. Quero parar, esmagar, partir esse impossível disco gramofónico que soa dentro de mim em casa alheia, torturador intangível. Quero mandar parar a alma, para que ela, como veículo que me ocupassem, siga em diante só e me deixe. Endoideço por ter que ouvir. E por fim sou eu, no meu cérebro odientamente sensível, na minha pele peculiar, nos meus nervos postos à superficie, as teclas tecladas em escalas, ó piano horroroso e pessoal da nossa recordação.
E sempre, sempre, como que numa parte do cérebro que se tornasse independente, soam, soam, soam as escalas lá em baixo, lá em cima...."
Livro do Desassossego, Bernardo Soares