quinta-feira, janeiro 05, 2012

O pó dos dias (II)


"Não sei como chamar a quem não fica nem amigo nem amor. Não encontrar um nome que descreva alguém assim talvez queira dizer que essas pessoas ficam em todo o lado e em lado nenhum. E, se bem me parece, é nisso que elas nos incomodam mais. Não fica amor, pelas razões que se imagina. Nem fica amigo porque, por mais que se exija tanto assim ao coração, ele nunca se esquece de quem o magoa. E desamparo, pela mão de quem se ama, dói demais. Às vezes, chamo-lhe afinadores (como se o nosso coração fosse um piano). Ajudam-nos a afinar para a subtileza de tudo o que sentimos. Para a forma como nos despertam ou nos agitam. Para o modo como nos arrepiam (sempre que nos falam ao ouvido). Ou para o jeito de dizer «gosto de ti». Para o modo como nos cheiram ou se chegam a nós, e acarinham. Para o furor das suas fúrias e para o encantamento que nos colocam à pele, sempre que são ingénuas. Para o modo como tocam, por dentro, e remexem por fora. Para as lágrimas que deixam ao nosso cuidado. Para  o modo como nos desabotoam os olhos. E, sempre que abrem neles outra janela, para o jeito de nunca os deixarem às escuras. Para o suor que, sempre que se mistura, nos adoça. E, é claro, para as figuras tristes e para as mensagens. Parvas."

Eduardo Sá, Nunca se perde uma paixão


Estou com estas palavras no olhar e o coração nas mãos, ainda. E batem forte cá dentro, como quem tem o meu nome impregnado do afecto que estas palavras transmitem, da verdade e dureza que a vida pode ser, quando as palavras nem amigo nem amor, fazem o desespero acordar sobressaltado como se alvorada fosse. E o som estridente do sofrimento soasse em torno do meu corpo inerte e cansado, triste e doente. Desejoso de ti e do amor que sentes e preferes calar e distanciar por força de não saberes ser feliz.  A distância ajuda a que os teus olhos não sintam e o teu coração não veja. Jogaste bem não me permitiste nem mais um vislumbrar sequer do teu sorriso. A tua defesa foi e será sempre o melhor ataque. Sei como o calor das minhas mãos pode queimar a ferida que existe dentro de ti. Sei o quanto te lembram do que não viveste. Sei o quanto o meu beijo te deixa a suspirar e o quanto a chuva não assume a metáfora dos dias felizes. Sei, sinto... um tremor só de pensar.